quinta-feira, 5 de março de 2009

O Brasil tem memória curta?

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) saiu, ontem, em defesa pública da cruzada pela moralização na política, proposta pelo senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) e encampada por um grupo de parlamentares. Talvez apostando na tese de que o povo tem memória curta, FHC bradou que a corrupção no País passou dos limites, e afirmou que as pessoas estão cansadas da impunidade.

Fica difícil não relembrar alguns fatos sinuosos ocorridos durante as duas gestões tucanas. Fatos como a suposta compra de votos no Legislativo para garantir a releição do próprio FHC, ou as sucessivas investidas - bem-sucedidas - do Planalto para barrar a criação de CPIs que investigariam denúncias. Uma delas, a mais emblemática, foi, sem dúvida, a luta palaciana para abortar a instalação da CPI mista da Corrupção, que iria dar uma "geral" nas denúncias feitas contra o governo ao longo dos anos.

Se é verdade que quem não deve não teme, por que não deixar-se investigar, se não há nada para esconder? O argumento - justo, de certa forma, mas não definitivo - do Planalto, era o de que avizinhava-se a disputa presidencial de 2002 e o PT e seus aliados na oposição pretendiam dar um tom eleitoral à CPI da Corrupção.

De toda forma, é bom rememorar certos acontecimentos passados ao longo das duas gestões tucanas que, por si, talvez justificassem a iniciativa da investigação. Vamos a eles:

- No início do primeiro mandato de FHC, surgiram denúncias de corrupção e tráfico de influências no contrato de US$ 1,4 bilhão para criar o Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam). Após a queda de um ministro e dois assessores, a CPI do Sivam aberta pelo Congresso terminou esvaziada pelos aliados e apresentou um relatório frio.

- Meses depois do SIVAM, explodiu a crise em alguns bancos brasileiros. Através do Proer, FHC liberou R$ 9,6 bilhões para um deles, o Banco Econômico, da Bahia, sob influência do senador aliado Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA). Nova CPI investigou o caso, mas, pressionados, os parlamentares agiram de forma superficial e sequer tomaram conhecimento de uma tal "pasta rosa", que supostamente conteria os nomes de 25 deles, que teriam recebido dinheiro do Banco Econômico.

- No final de 1996, irregularidades na venda de títulos públicos do Departamento de Estradas de Rodagem teriam gerado um prejuízo estimado para a União em torno de R$ 3 bilhões. Pressionado, FHC extinguiu o DNER, mas seus aliados no Congresso abafaram a iniciativa da oposição de criar uma CPI para investigar o caso.

- No dia 4 de junho de 1997, o Senado Federal promulgou a lei - previamente aprovada pela Câmara dos Deputados - que permitia a reeleição de FHC. A emenda, que provocou intensos debates desde que foi proposta, deixou um rastro de suspeitas até hoje mal esclarecidas. Entre elas, a de que alguns parlamentares teriam recebido uma quantia estimada em R$ 200 mil para votar a favor. Os deputados Ronivon Santiago e João Maia (ambos do PFL do Acre), surgiram como exemplos de beneficiados com a propina, e negaram tudo. Mas o governo FHC - pai do Plano Real - jamais conseguiria se livrar da pecha de que teria corrompido o Legislativo.

- No processo de privatização do sistema Telebrás, escutas clandestinas gravaram conversas entre o ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, e o dirigente do BNDES, André Lara Resende. Os dois estariam articulando apoio a Previ, fundo de previdência do Banco do Brasil, para beneficiar o consórcio do banco Opportunity, que tinha como um dos donos o tucano Pérsio Árida. FHC conseguiu, novamente, evitar a instalação de uma CPI no Legislativo.

- Eduardo Jorge Carvalheira, secretário particular de FHC, entrou para o noticiário político após ser acusado de liberar cerca de R$ 169 milhões para obras do TRT-SP e de esta rmontando um esquema de caixa dois para a reeleição de FHC. Ele também teria utilizado irregularmante verbas dos fundos de pensão no processo das privatizações. As tentativas de investigação foram todas abafadas.

Além desses episódios - mais emblemáticos, digamos assim - o governo FHC ainda contou com uma ajuda importante na área investigativa. Ao final do mandato, o então procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro - apelidado de "engavetador-geral" da República - teria arquivado ou engavetado 459, dos 626 inquéritos instalados até maio de 2001 para investigar denúncias contra o governo e seus aliados. Os processos envolviam 194 deputados, 33 senadores, 11 ministros e ex-ministros. O próprio FHC era alvo de quatro deles.

Passados pouco mais de seis anos desde que deixou o poder, o ex-presidente, ontem, saiu-se com esta: "Quem tem amor ao País dará razão a Jarbas Vasconcelos. As coisas estão demais!".

Parece, mesmo, é que está tudo como antes. Mas FHC tem razão, sim. É hora de acabar com velhos vícios.

Um comentário:

Anônimo disse...

Esse FHC vai defender moralização depois de tanta corrupção no governo dele, e Lula apóia a eleição de Collor, seu adversário ferrenho, para uma comissão importante no Senado, em detrimento de uma senadora aliada do PT. Parece que os políticos é que tem crise de memória.