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Política e cotidiano
sexta-feira, 16 de setembro de 2011
Ministro com folha corrida
Pode ser levado a sério um país onde, para nomear um ministro, a presidente da República precisa antes mandar passar um "pente fino" no passado de cada candidato à vaga? Pois foi o que ocorreu com o deputado federal Gastão Vieira (PMDB-MA), substituto do colega peemedebista Pedro Novais, outro maranhense.
Só para refrescar a memória, Novais é o segundo ministro indicado pelo PMDB a ser demitido sob suspeita de corrupção. O primeiro foi Wagner Rossi (Agricultura). Houve um terceiro peemedebista dispensado, Nelson Jobim. Mas este saiu depois de falar mal da própria equipe ministerial.
Além de Gastão Vieira, Dilma Rousseff tinha mais um punhado de nomes do PMDB para o cargo. Ressabiada, mandou investigar a "ficha política" de cada um deles. Dois esbarraram na Lei da Ficha Limpa, enquanto outro carecia de empuxo político. Sobrou Gastão, cuja indicação, de quebra, agradava ao presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), padrinho político do demitido Novais.
Vencida essa página, o que fez a presidente? Foi prestigiar o encontro nacional do PMDB, em Brasília, e lá atuou como mestre de cerimônias. Ao discursar, Dilma rasgou elogios ao partido, que classificou como um "parceiro fundamental" no seu governo, sobretudo as suas bancadas parlamentares na Câmara e no Senado, "sempre presentes e leais quando estão em jogo os interesses do País e do povo".
A retórica da presidente, de fato, está cada dia melhor. E a cada dia ela age com mais naturalidade. Prova disso é vê-la sapecar tantos elogios à uma bancada parlamentar conhecida exatamente pelo capricho de só votar qualquer projeto de interesse do País se, antes, seus próprios "interesses" forem contemplados. E alguns desses interesses, para falar o mínimo, são indizíveis.
Mas cabia a Dilma Rousseff, na festa peemedebista, acalmar os ânimos de um partido que, pela sua força e dimensão, precisa obrigatoriamente ser afagado por qualquer governante que não deseje ser inviabilizado. A presidente mostrou ter aprendido bem essa lição desde a época em que atuou como ministra da Casa Civil do ex-presidente Lula, seu padrinho político e professor de jogo de cintura com o Congresso Nacional.
Afinal de contas, embora esteja cercada por mulheres nos cargos-chave da política na sua equipe, pairam sobre Dilma a sombra de dois homens poderosos, que não devem ser contrariados: o vice-presidente da República, Michel Temer, e o presidente do Senado José Sarney.
O primeiro, que é ex-presidente nacional do PMDB, até hoje vem cumprindo à risca as determinações que lhe são repassadas pelo segundo. E este segundo, a cada dia se mostra mais cardeal dentro do governo petista.
De fato, é uma relação complicada para a presidente, esta com o PMDB. Do tipo ruim com ele, pior sem ele.
segunda-feira, 22 de agosto de 2011
A bola da vez
A permanência ou não do ministro do Turismo, Pedro Novais, no cargo será um bom indicativo para avaliar até que ponto a presidente Dilma Rousseff (PT) pretende levar a sua “faxina ética” no governo. Depois das recentes exonerações dos ministros Alfredo Nascimento (Transportes) e Wagner Rossi (Agricultura), Novais se tornou a bola da vez na lista dos auxiliares queimados por denúncias de corrupção.
Mas há um porém envolvendo o Ministério do Turismo: é a segunda pasta comandada por um representante do PMDB – segundo maior partido da base governista, depois do PT – a enfrentar acusações de desvio verbas públicas.
Se seu ocupante fosse filiado a um partido com menos força junto ao Palácio do Planalto, talvez fosse fácil apostar na sua saída imediata. A questão é que Dilma já exonerou o peemedebista Wagner Rossi. E a contragosto do vice-presidente Michel Temer, seu correligionário, que fez tudo para tentar contornar a situação.
Sacar outro ministro peemedebista neste momento pode render à presidente um abalo irreparável na sua base de sustentação. E, bem treinada como foi quando comandou a Casa Civil, Dilma sabe muito bem que com o PMDB não se brinca.
Texto publicado na coluna Cena Política, do JC - 22/08/11
quinta-feira, 18 de agosto de 2011
Sabão no olho
O ministro da Agricultura Wagner Rossi, que entregou o cargo ontem, provavelmente não será a última baixa sofrida pelo governo Dilma Rousseff (PT) com a "faxina ética" que a presidente deflagrou há cerca de um mês.
Muito pelo contrário, talvez esse processo de desinfecção no Planalto esteja apenas começando. Afinal, mesmo após cinco trocas de ministros, as denúncias de corrupção, de malversação de verbas públicas e de tráfico de influência continuam a pipocar.
As mangueiras e vassouras estão, agora, voltadas para o Ministério do Turismo, cujo secretário executivo Fred Costa - que pode ser chamado de vice-ministro - é suspeito, segundo a Polícia Federal, de envolvimento em (mais um) esquema de desvio de recursos que seriam destinados a emendas parlamentares.
O caso, guardadas as devidas proporções, é semelhante ao que culminou com a saída de Rossi. Para quem não lembra, os problemas na Pasta de Agricultura começaram com denúncias envolvendo o segundo no comando, Milton ortolan, envolvido com um lobista que fazia "ponto" dentro do ministério.
Como é sempre bom refrescar a memória é sempre bom, vamos lá: o primeiro a deixar o governo Dilma foi o ministro da Casa Civil Antônio Palocci. O petista é reincidente, já que, no governo Lula, foi obrigado a entregar o Ministério da Fazenda depois das acusações de que teria ordenado a quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo, que testemunhara a presença do ministro numa mansão "suspeita" no Lago Sul de Brasília, onde empresários e lobistas se reuniam para, digamos, trocar umas "ideias".
O segundo a perder a pose na equipe foi também um petista, Luiz Sérgio. Com a saída de Palocci, ele foi remanejado do Ministério das Relações Institucionais para a obscura Secretaria de Pesca. O motivo: Dilma queria dar mais força à pasta, e ele não tinha o perfil adequado. em seu lugar a presidente nomeou a combativa ex-senadora petista Ideli Salvatti.
Pivô da maior crise política da nova gestão, o terceiro a cair foi o ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento. Filiado ao PR, Nascimento foi uma "herança" deixada por Lula para Dilma. Um verdadeiro presente de grego, e foi exatamente por causa das denúncias na pasta dos Transportes que a presidente deflagrou sua faxina ética. Com o ex-ministro, caíram mais de 20 auxiliares.
Antes da queda de Wagner Rossi, Dilma Rousseff ainda amargou a saída do peemedebista Nelson Jobim, titular da pasta da Defesa. Mas Jobim não entregou o cargo sob denúncias de corrupção. Ao contrário, ele se queimou por falar mal, com certa frequência, dos próprios colegas de ministério.
É bom lembrar que Dilma tem apenas oito meses de governo. Ainda lhe restam três anos e quatro meses para concluir o mandato. Se fizermos um cálculo proporcional, quantos ministros ela ainda terá que substituir nesse período?
O problema mais sério, porém, não é mudar auxiliares. Nomes, existem às toneladas. A questão é o tamanho da ressaca que algumas eventuais trocas possam causar à presidente. Porque se ela começar a mexer demais nas indicações dos aliados - leia-se, o PMDB - pode terminar perdendo o controle da sua base de apoio no Congresso Nacional, onde o partido do vice-presidente Michel Temer manda e desmanda.
Se o PMDB - dono da maior bancada na Câmara dos Deputados e a segunda maior no Senado - decidir seguir o exemplo do PR, que, simulando indignação com a demissão de Alfredo Nascimento, decidiu romper com Dilma, vai faltar voto para aprovar projetos de interesse do governo no Legislativo. Pior ainda: podem sobrar votos para aprovar a criação da CPI da corrupção, tão sonhada pelas oposições.
sexta-feira, 17 de junho de 2011
Uma reforma frágil
A cada entrevista que faço ou debate que participo sobre a propaladíssima reforma política, mais fico descrente do sucesso da "empreitada" no Congresso Nacional. Antes um entusiasta das mudanças propostas, aos poucos começo a me convencer de que estamos atropelando o processo ao discutir sistemas eleitorais, voto em listas ou financiamento de campanhas.
É claro que são todos dispositivos bem intencionados e necessários ao aprimoramento da democracia. Mas nos últimos 25 anos, a cada campanha eleitoral que passa, se promete reforma política. E logo que acaba a disputa, o assunto cai no esquecimento.
Ora, se essas propostas já esperaram nas gavetas do Legislativo por mais de um quarto de século, elas podem aguardar mais alguns anos enquanto se resolve o aspecto realmente primordial da reforma: o velho e corrompido sistema partidário brasileiro.
Vários especialistas já alertaram que no cenário atual, com 28 partidos inscritos na Justiça Eleitoral e mais um punhado deles solicitando registro oficial, é impossível resolver qualquer outro aspecto da reforma.
Sem partidos sólidos e coerentes com seus conteúdos programáticos - pedir nitidez ideológica já seria demais - o que deve sair do Congresso, ao final de todo o atual processo, é um frankenstein. Uma lista de regras que só vão maquear - e talvez agravar - os problemas do nosso sistema eleitoral.
Como disse recentemente um desses especialistas, é preciso fazer primeiro a reforma política para depois tratar da reforma eleitoral. Eu diria mais: primeiro seria necessário promover uma reforma partidária para, só então, começar a sonhar com melhorias nas regras das disputas.
Tentar qualquer alteração sem antes mudar o cenário dos partidos seria o mesmo que construir um telhado novo sobre uma base velha e comprometida. Mais cedo ou mais tarde toda a estrutura despenca.
segunda-feira, 2 de maio de 2011
O terror está vivo
Não pretendo, aqui, fazer juízo de valor sobre o tratamento que os Estados Unidos dão ao resto do mundo. Nem tampouco condenar o discurso anti-americanista formulado, sobretudo, pelas esquerdas. O que me preocupou mais do que tudo – ao assistir nesta madrugada de domingo para segunda-feira, ao noticiário em tempo real sobre a morte do chefe maior da Al Qaeda, Osama Bin Laden – foi a absoluta falta de reflexão do povo norte-americano.
Ao tomar conhecimento da morte do terrorista – responsabilizado pela morte de milhares de pessoas no atentado às torres gêmeas, em setembro de 2001 – muitos americanos correram às ruas para festejar, de bandeiras em punho. Concentrações em frente à Casa Branca e em outros pontos do país foram transmitidas ao vivo pelas redes de TV dos EUA. Para o mundo todo. O que inclui o mundo árabe.
Os muçulmanos são pessoas tão pacíficas quanto os seguidores de qualquer outra religião. O que preocupa são as exceções. Aqueles que preferem interpretar o Corão pelo ângulo da violência, baseados apenas em trechos de algumas suras.
Essas pessoas, que vivem para difundir o ódio, certamente assistiram às cenas transmitidas pela televisão americana. No exato momento em que lamentavam a morte do seu líder maior – para eles, um herói – viam seus grandes inimigos comemorarem em praça pública. Se isso não é combustível para alimentar mais a raiva, nada mais é.
Em vez de se comportarem como se ninguém mais existisse no planeta, indo às ruas bradar como torcida organizada de futebol, s americanos deveriam engolir esse sentimento de vitória e comemorar de uma forma menos ostensiva.
O problema é que a maior parte da população dos EUA não entende, por exemplo, que enquanto a questão palestina não for resolvida, o ódio e o terror permanecerão. Culpa dos formuladores da política externa dos EUA, que não deixam claro ao povo que o apoio integral do país a Israel custa caro, acirra os ânimos e avoluma os problemas.
Não tiro a razão dos que perderam alguém nos atentados. Ou dos que se sentiram ultrajados com um ataque tão atrevido, dentro das suas fronteiras. Mas para combinar com o discurso feito pelo presidente Barack Obama ainda na madrugada – destacando que a morte de Bin Laden representava uma busca pela paz e liberdade para todo o mundo – não seria melhor manter um comportamento mais low profile?
Afinal, vibrar nas ruas como se a guerra contra o terror tivesse simplesmente ganha é como tapar o sol com a peneira. É ignorar solenemente os efeitos adversos que a morte de Bin Laden pode desfechar sobre os Estados Unidos.
quinta-feira, 28 de abril de 2011
Tábua de salvação
O Brasil de hoje tem 28 partidos inscritos formalmente no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sem falar nos outros que aguardam a apreciação do seu pedido de registro. De todos estes, seis ou sete podem ser realmente levados a sério. Os demais, ou são verdadeiros balcões de negócios ou não representam nenhum grupo ou setor da sociedade. São blocos do "eu sozinho".
A permissividade da atual legislação é a grande responsável por esse excesso que, ao contrário de ajudar, só atrapalha a construção de uma democracia séria no País. A regulamentação de uma nova lei dos partidos políticos é um dos itens mais urgentes e necessários na pauta de uma eventual reforma política. Digo eventual porque, por mais que seus defensores se esforcem, ainda não acredito que ela venha a se concretizar. Pelo menos não da forma como a sociedade deseja.
Mas independente de qualquer reforma que venha a ser votada no Legislativo, um outro tipo de mudança está sendo negociada, e se consolidada, terá um impacto razoável no cenário político. É a fusão do PSDB com o DEM. Os dois partidos governaram juntos o País por oito anos, e há oito anos dividem a oposição ao governo petista.
Essa condição de opositor enfraqueceu as duas legendas, mas machucou muito mais os demistas que os tucanos. Descendente de uma árvore genealógica totalmente adversa ao modelo de centro-esquerda adotado pelo PSDB, o DEM traz no sangue sinais genéticos da Arena, do PDS e do PFL, ainda que tenha deixado pelo caminho parte do conservadorismo dos ancestrais.
Historicamente falando, também não ajudou o fato de o DEM - ou seu antecessor PFL - ter se colocado como coadjuvante do poder. À exceção do ex-vice-presidente Aureliano Chaves, o partido nunca encabeçou uma chapa na disputa presidencial, optando pela vice do PSDB em 1994 e 1998. Em 2002, o PFL sequer esteve representado em alguma chapa. Simplesmente apoiou a dobradinha PSDB-PMDB.
Em 2006, o DEM reassumiu seu papel tradicional, na vice da chapa do tucano Geraldo Alckmin. Em paralelo foi, aos poucos, perdendo também o domínio político nos Estados.
Aquele PFL que na primeira eleição direta pós-golpe militar, em 1982, elegeu quase todos os governadores brasileiros - inclusive os dos nove Estados do Nordeste - em 2006 só conquistou o governo do Distrito Federal, José Roberto Arruda. Aí veio o escândalo do mensalão, Arruda renunciou e o partido perdeu o único comando estadual que tinha.
Em 2010, num esboço de reação, o DEM elegeu dois governadores: Rosalba Ciarlini (RN) e Raimundo Colombo (SC). Mas hoje o catarinense está de malas afiveladas para cair fora. Isso sem falar na redução significativa das bancadas parlamentares na Câmara dos Deputados - que já foi a mais numerosa -, no Senado e nas assembleias estaduais.
Diante desse retrato cruel, mas realista, a proposta de fusão com o PSDB pode até não ser tão vantajosa para os tucanos. Mas com certeza seria o caminho da salvação para os ex-pefelistas.
segunda-feira, 25 de abril de 2011
O PMB de Eduardo
A política é feita de ciclos, alguns muito semelhantes, ainda que décadas os separem. É o caso do Partido Social Democrático (PSD), fundado há cerca de um mês pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, e avalizado de pronto pelo presidente nacional do PSB, governador Eduardo Campos.
Em Pernambuco, o PSD deverá representar para Eduardo o que o extinto Partido Municipalista Brasileiro (PMB) significou para o seu avô, Miguel Arraes. Em 1988, ainda ligado ao PMDB, o governador Arraes recebia inúmeros pedidos de filiação ao partido de pretensos candidatos a prefeito e vereador em todo o Estado. Visando evitar o inchaço do PMDB local, ele direcionou essas filiações para o PMB, comandado pelo senador Antônio Farias, seu companheiro de chapa em 1986.
Um quadro bem parecido se desenha agora para Eduardo Campos. É no PSD que o governador deve posicionar boa parte dos seus candidatos a prefeito e vereador em 2012, evitando crescimento exagerado do PSB. Não é à toa que, assim como Arraes fez com Farias e o PMB, Eduardo apadrinhou a filiação do ex-deputado André de Paula (ex-DEM) ao PSD, e ainda lhe entregou a presidência local do partido. Tudo muito semelhante...
* Texto publicado na coluna Cena Política, em 25/04/2011
terça-feira, 19 de abril de 2011
Pessedismo de roupa nova
Certa vez, li uma definição interessante para a expressão "pessedismo": o exercício da moderação e do equilíbrio, que gera a capacidade de sobreviver sempre, tão perto do poder quanto possível. Na ocasião, estava sendo descrito o velho pessedismo, linha política da qual foram adeptos vários personagens históricos, a exemplo dos ex-presidentes Juscelino Kubitschek e Eurico Gaspar Dutra, e em Pernambuco, os ex-governadores Agamenon Magalhães e Miguel Arraes.
O velho Partido Social Democrático (PSD) foi fundado em 1945, sob os auspícios do então presidente Getúlio Vargas, que queria ampliar sua base de sustentação e garantir proteção contra os ataques da conservadora UDN. Para isso, tratou de solidificar no PSD o apoio das elites municipais, os chamados "coronéis", interessados em se manter dentro do círculo de poder. Anos depois, quando o golpe militar de 64 extinguiu a legenda, expôs seu "ecletismo". Enquanto parte dos filiados migrou para o MDB - de oposição aos generais - outra parte buscou abrigo sob o guarda-chuva da Arena governista.
Quase 70 anos depois, o fantasma do pessedismo é invocado das profundezas pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab. Embora com raízes fincadas no DEM, ex-PFL, ex-PDS e ex-Arena, Kassab revelou um jogo de cintura bem pessedista logo nas primeiras costuras do novo partido. Com a tradicional simplicidade com que os políticos costumam justificar seus atos, explicou que pretende fazer uma "oposição responsável" à presidente Dilma Rousseff (PT), "criticando o que considerar errado e elogiando o que for correto".
Curioso é como o discurso pessedista ainda tem o poder de "abrandar" o fogo das oposições. Hoje, Kassab tem como principal aliado e conselheiro o presidente nacional do PSB, Eduardo Campos. Mas o respaldo do governador de Pernambuco não é gratuito. Muito pelo contrário. Raposa política, Eduardo já joga com a hipótese de fundir o PSD ao PSB, ampliando sua força política no País para o projeto maior dos socialistas em 2014.
Mais curiosos ainda são alguns nomes que poderão vir a cerrar fileiras com Kassab e, por consequência, com Eduardo Campos. Já estão de malas prontas para ingressar no PSD figuras como a senadora Kátia Abreu (DEM-TO) - líder da bancada ruralista e duríssima adversária de DIlma e do MST -, o vice-governador baiano Otto Alencar (PP), eleito na chapa do petista Jaques Wagner, e o vice-governador de São Paulo Guilherme Afif Domingos (DEM), companheiro do governador tucano Geraldo Alckmin.
E Pernambuco não poderia ficar ausente do novo pessedismo. O comando local do partido será entregue ao ex-deputado federal André de Paula, que por longos 17 anos presidiu o PFL estadual e atuou no alto comando da oposição a Miguel Arraes e ao seu neto, o atual governador. Eduardo Campos, agora, tornou-se padrinho da filiação do ex-adversário ao PSD, deixando claro, mais uma vez, o dote pessedista que herdou do avô.
quarta-feira, 13 de abril de 2011
No bolso do paletó
Quem é mesmo esse povo que os deputados estaduais representam no poder? Seria aquele cidadão que acorda cedo, chacoalha pendurado em ônibus invariavelmente lotados e dá duro seis dias por semana para garantir um salário mínimo no fim do mês?
Ou seria aquele cidadão usuário de um sistema de saúde pública precário - para dizer o mínimo - com longas filas nas emergências e consultas médicas marcadas às vezes com até um ano de antecedência?
Poderia ser ainda aquele cidadão dependente de um sistema de educação pública capenga, ultrapassado, com professores pouco capacitados e mal-remunerados, e sem condições de sequer sonhar com seus filhos na universidade?
Quem, na classe média, ousaria bater no peito e se dizer representado por esses senhores, que legislam diuturnamente em causa própria, criando dispositivos que lhes permitam embolsar mais e mais recursos públicos, quando praticamente a metade dos cidadãos que pagam impostos não têm dinheiro que sobre no final do mês?
Você se sentiria representado por um político que, para aprovar um projeto de interesse do Estado, precisa ser bajulado pelo Executivo e ter uma série de exigências atendidas, sob a ameaça de simplesmente "desaparecer" na hora da votação?
Pois bem. Esse é o retrato da atual Assembleia Legislativa de Pernambuco. Como de resto, de outras tantas casas legislativas pelo País afora. A situação chegou a um ponto de insustentabilidade que está levando entidades da sociedade civil a se mobilizarem para interferir, na tentativa de deter a voracidade dos parlamentares e fazê-los enxergar que nem tudo é mordomia no Poder.
No momento, a seccional pernambucana da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PE) decidiu dar combate a um antigo absurdo cometido pelos deputados com o dinheiro do imposto nosso de cada dia: o "auxílio-paletó".
O benefício - que consome cerca de R$ 2 milhões anuais dos cofres públicos - foi assim apelidado porque inicialmente previa uma ajuda de custo para que cada um dos 49 deputados pudesse se vestir condignamente para o trabalho de representar o povo. Porém, como tudo o mais no Legislativo, o auxílio-paletó foi distorcido. Passou a ser pago indistintamente - inclusive aos suplentes que porventura assumam a vaga durante apenas alguns meses - e sem a necessidade de prestação de contas pelo beneficiário.
Hoje, o auxílio-paletó garante a cada parlamentar pernambucano pelo menos mais dois salários mensais ao ano, um no início e outro ano final de cada período legislativo. E é sempre bom lembrar o valor do salário de um deputado estadual - calculado em 75% da remuneração de um deputado federal: R$ 20 mil.
O 14º e o 15º salários dos senhores deputados, pagos sob o título de auxílio-paletó, é mais uma mordomia acrescida a uma lista que já não é pequena, que inclui outros tantos "vales", "verbas" e "auxílios".
Se mesmo diante de tudo isso, uma parte da sociedade consegue enxergar identidade entre um deputado estadual e o cidadão que ele supostamente representa no poder, a outra parte - ainda capaz de se indignar - deve estar precisando usar óculos.
terça-feira, 29 de março de 2011
Um vice nada figurativo
Diz a regra que, depois que um sujeito morre, só se deve falar bem dele. Pois então que se cumpra a regra.
Sobre o bem-sucedido empresário têxtil José Alencar - aquele proprietário da poderosa Coteminas - não me atrevo a comentar. Não é minha praia. Prefiro focar no José Alencar político, ex-senador, ex-vice-presidente da República e um impressionante conciliador, qualidade reconhecida em vida, mas que vale a pena relembrar após sua morte.
É inegável a importância de Alencar na construção da candidatura vitoriosa de Lula em 2002. Não fosse sua participação, é quase certo que não teria havido a aproximação necessária dos petistas com o empresariado brasileiro, elite mandatária que define, de fato, quem chega e quem sai do poder. Que o diga o ex-presidente Fernando Collor.
Também é fato que a mineirice de Alencar ajudou a construir o diálogo com esse setor. Corajoso, ele aceitou o convite dos artífices da candidatura Lula para assumir a vice absolutamente ciente de que ali estava não por uma questão de simpatia dos petistas. Longe disso.
O senador foi escolhido vice como parte de uma estratégia bem montada pelos caciques do PT nos quatro anos que sucederam a última derrota de Lula. Estratégia que incluiu uma guinada no discurso e a flexibilização de várias teses de origem marxista.
As mudanças ficaram bem claras na Carta ao Povo Brasileiro, divulgada pelo próprio Lula em junho de 2002, pouco antes de assumir a quarta candidatura. Após três quedas sucessivas nas urnas, mesmo contando com a simpatia das classes menos favorecidas, os petistas sabiam que caminhariam para um quarto fracasso, se não conseguissem o apoio de alguém com real penetração na poderosa casta que define os destinos da política nacional.
O mineiro de Curiaé sabia muito bem o papel que lhe caberia, e o cumpriu com afinco e competência. Ao ponto de, ao final de algumas palestras - como fopi possível testemunhar na Federação das Indústrias de Pernambuco (Fiepe) - despertar surpreendentes declarações de apoio a Lula por parte de empresários que antes demonizavam o ex-líder sindical, considerado um verdadeiro bicho-papão pela elite financeira.
Mas Alencar era tão envolvente que a aliança, em princípio meramente eleitoral, terminou descambando para o lado afetivo. Em 2006, pronto para disputar a reeleição, Lula foi instado por alguns auxiliares a substituir seu companheiro de chapa. Para esses petistas, pela boa aceitação que a gestão recebia, já era possível dispensar Alencar para buscar um nome que agregasse mais politicamente. Talvez no interesseiro PMDB.
Lula rejeitou a tese e bateu o pé. Ali, já admitia abertamente, sua relação com Alencar extrapolara o caráter político. Sem desmerecer a competência do vice-presidente, ele enxergava em Alencar uma espécie de figura paterna. Mais quatro anos e essa relação de confiança se consolidou de uma forma pouco provável para quem lembra das origens do PT.
José Alencar detonou a tese do vice figurativo. Mesmo primando pela discrição - e nisso a sua mineirice ajudou - fez questão de manifestar opinião própria sobre as questões de governo. Opiniões às vezes meio incômodas. Algumas até incendiárias. Mas foi assim, na marra, que ele conquistou seu lugar no núcleo do poder e ganhou o respeito não apenas dos políticos, mas de muita gente que já nem acredita tanto na política.
segunda-feira, 21 de março de 2011
Partindo para a ofensiva
Quem assistiu à TV em horário nobre no fim de semana passado testemunhou o início da ofensiva montada pelo prefeito do Recife, João da Costa (PT), na tentativa de pavimentar a própria reeleição, em 2012. A propaganda institucional da Prefeitura, veiculada nos meios de comunicação, passou por uma reformulação, ficou mais dinâmica e agressiva. Mas o ponto alto dessa "repaginada" foi a mudança do slogan. Agora, o prefeito avisa: "Primeiro a gente faz, depois a gente mostra".
Além do cidadão-eleitor recifense, a mensagem de João da Costa tem dois destinatários certos: A oposição, com suas denúncias sobre obras inacabadas e acusações de paralisia da gestão, e os aliados - ou ex-aliados, no caso do ex-prefeito João Paulo (PT) - que nos bastidores já vinham discutindo "alternativas" para a disputa de 2012 no Recife, diante das várias dificuldades políticas e administrativas enfrentadas pelo prefeito na capital.
No caso de João Paulo, aliás, a alfinetada é direta. Não foram poucas as vezes em que o ex-prefeito fez festa para inaugurar obras da sua gestão que ainda não estavam totalmente concluídas, quer fosse uma simples rua ou um gigantesco parque em Boa Viagem.
Na época, como aliado, secretário e candidato preferido à sucessão, João da Costa não deu um pio contra o comportamento do padrinho político. Só falou depois do rompimento.
Vale lembrar que a nova estratégia - que pretende dar mais visibilidade ao mandato do prefeito - foi deflagrada logo após suas aparições públicas ao lado do marqueteiro Antônio Lavareda, durante o Carnaval. E antes que alguém fale em coincidências, é bom advertir: em política, elas não existem. Simples assim. Tudo é sempre pensado, calculado, negociado.
É claro que Lavareda pode não ter nada a ver com a ofensiva da PCR. Mas também pode ter tudo a ver com ela. O "mago" das pesquisas - como ele gosta de ser tratado - não foi contratado pelo prefeito, ao menos formalmente.
Lavareda pode, no máximo, ter dado um conselho ou outro. E se assim foi, funcionou. Afinal, há pelo menos seis meses a Prefeitura do Recife não aparecia com tanta força nos meios de comunicação. Mesmo dispondo de um razoável orçamento, de R$ 16 milhões, para gastos com publicidade institucional no ano passado, a imagem da gestão passou longe do eleitor e a do prefeito continuou em queda livre nas avaliações dos institutos de pesquisa.
Com a nova estratégia de marketing - que pretende massificar a divulgação das obras e colocar o prefeito nas ruas, em contato direto com as comunidades - o núcleo duro da PCR espera ver o ponteiro da popularidade se mover. Para cima, claro.
Até porque, se os indicadores não melhorarem até outubro - ou seja, um ano antes das eleições - a situação pode ficar bem mais complicada e ameaçar de verdade os planos de reeleição de João da Costa. Que dessa vez depende exclusivamente dos seus próprios esforços para garantir um novo mandato.
quinta-feira, 17 de março de 2011
O sujo e o mal lavado
Achei que já tinha visto "de um tudo" na política e no futebol. Mas errei feio. Jamais imaginei, por exemplo, que iria assistir a essa interessante queda de braço entre duas figurinhas carimbadas como o deputado federal Anthony Garotinho (PR-RJ) e o presidente da CBF, Ricardo Teixeira.
É, literalmente, o sujo falando do mal lavado.
Pois não é que o ex-governador fluminense - do alto das suas denúncias e processos por corrupção - decidiu levar a cabo o pedido de abertura de uma CPI na Câmara dos Deputados para investigar os desmandos de Teixeira nos preparativos da Copa de 2014?
É o fim do mundo!
O presidente da CBF poderia ser classificado como a figura mais repugnante, descarada e esquiva que já surgiu na moderna onda de cartolagens e negociatas que feriram de morte o futebol brasileiro. O deputado Garotinho, por sua vez, ganhou notoriedade pela forma, digamos, pouco ortodoxa com que administrou as finanças públicas quando prefeito de Campos (RJ) e, posteriormente, como governador do Rio de Janeiro.
No entanto, por incrível que pareça, dessa vez Garotinho acertou a mão. Investigar Ricardo Teixeira é algo que muitos já tentaram fazer, sem sucesso. O homem tem costas mais quentes que ferro em brasa, seja pela família, entre os amigos e no poder. Esse é um primeiro motivo pelo qual não acredito no sucesso da empreitada do parlamentar fluminense.
O outro motivo é que desconfio das reais intenções de Garotinho ao propor uma CPI como essa. Ou ele tem - ou tinha - "negócios" com Ricardo Teixeira e foi, de alguma forma, passado para trás, engabelado pelo presidente da CBF, o que não seria surpresa. Ou então está aproveitando a onda da Copa do Mundo para se promover e tentar reaver o governo do Rio de Janeiro, cujo eleitorado que fez dele o deputado campeão no Estado, com quase 700 mil votos.
Certo mesmo é que esse pedido de CPI não foi motivado pela intenção do nobre congressista de preservar o bem público.
Já Ricardo Teixeira se antecipou em proteger seu bem privado, a CBF. Esteve no Congresso conversando com deputados e senadores e mobilizou os presidentes de federações estaduais de futebol, seus aliados, para pressionar as bancadas parlamentares em seus Estados e barrar a investigação.
Coisa de quem, absolutamente, tem culpa no cartório.
segunda-feira, 14 de março de 2011
E o prefeito se move...
O prefeito do Recife, João da Costa (PT), está, de fato, longe de ter a unanimidade no bloco governista. Sua candidatura à reeleição – que deveria ser pensada como natural – tem sido questionada, embora em reserva, por setores do palanque liderado pelo governador Eduardo Campos (PSB). O rompimento com o ex-padrinho político João Paulo (PT) também ajudou a criar uma certa desconfiança entre os aliados.
Mas ninguém se engane: o prefeito está disposto a ir à luta. Depois da licença médica de 101 dias, ele parece ter despertado para a necessidade de pavimentar a própria reeleição, e dá vários sinais nesse sentido. Seja no empenho em fazer um bom Carnaval no Recife, seja na busca de mais diálogo com líderes do bloco governista, inclusive o próprio Eduardo Campos.
O fato é que João está se movendo. E alguns desses movimentos, até pelo caráter inesperado, atraem atenções e geram polêmica, jogando o prefeito no foco das discussões. Funciona.
Só os mais inocentes, por exemplo, acreditariam que as sucessivas aparições ao lado do marqueteiro Antônio Lavareda têm apenas caráter “social”. Os dois passaram a semana pré e o Carnaval inteiro se encontrando. No sábado ainda foram ao Rio de Janeiro assistir ao desfile das escolas de samba campeãs.
Dono de baixos índices de popularidade, se o prefeito estiver buscando aconselhamento, Lavareda é um nome bem adequado. Muito embora tenha sido demonizado pelo PT por muitos anos, quando cuidava das campanhas de Jarbas Vasconcelos & cia.
Enfim, se o projeto de João da Costa é chacoalhar o cenário pré-eleitoral no Recife para tentar marcar presença, até agora tudo está seguindo dentro dos conformes.
* Texto publicado na coluna Cena Política - JC, 14/03/2011
Novo espaço para debates políticos
Retomando as atividades do blog, após longas e merecidas férias. E hoje comemorando o lançamento de um novo blog coletivo, com grandes cabeças pensantes da política pernambucana. É o PE na política
Muito me honra o convite para participar dessa novidade, comandada pelo competente jornalista Cristiano Ramos, com quem tive o prazer de travar bons debates políticos, no saudoso programa Opinião Pernambuco, na TVU.
Prestigiem o PE na política
www.penapolitica.com.br
Saudações cordiais
sexta-feira, 31 de dezembro de 2010
E Lula quebrou o tabu...
Após oito anos no poder, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deixa, amanhã, o Palácio do Planalto. E sairá levando debaixo do braço um índice recorde de 87% de aprovação e um lugar garantido no pódio da história política contemporânea do Brasil.
Mas é preciso admitir - parafraseando o próprio Lula - que nunca antes na história deste País se viu tanta polêmica em torno de uma única pessoa. Embora tenha estabelecido uma relação de absoluta confiança com as classes menos favorecidas, Lula ainda desperta o descrédito - e até algum ódio - em muita gente. Sobretudo nas elites.
É fácil explicar a aprovação ao petista. Difícil é justificar sua rejeição. Afinal, beneficiado com a política econômica que herdou dos tucanos, Lula consolidou a estabilidade financeira, tirou mais de 20 milhões de pessoas da linha de miséria, transformou o tsunami da crise mundial em uma marolinha e ampliou nossas fronteiras internacionais. Entre outros feitos que muita gente jamais pensou que pudessem acontecer.
É verdade que houve o mensalão. Também houve uma relação suspeitíssima com velhos caciques políticos do País. Houve loteamento de cargos, aparelhamento do Estado e, para coroar, a indução de uma candidatura presidencial com a força da máquina pública.
Mesmo assim, Lula conseguiu contrariar a tradição de que presidentes do Brasil só deixam o cargo desgastados e sem prestígio popular. A dúvida que resta, porém, é se Dilma Rousseff (PT), com toda a estrutura que herdará do padrinho político, conseguirá repetir a quebra desse tabu.
Dilma não é Lula, não fala como Lula, não age como ele. Os mais próximos garantem, porém, que Dilma pensa como Lula. Se assim for, já é um bom começo. Não custa dar à nova presidente um voto de confiança, e desejar a ela - e a todos os brasileiros - felizes 2011, 2012, 2013 e 2014.
quarta-feira, 29 de dezembro de 2010
Segredos públicos
Transparência é uma palavra longa e bonita, e muita gente enche a boca para pronunciá-la. Mas na hora de seguir à risca seu significado, termina deixando a desejar. Alguns políticos, por exemplo, quando questionados sobre assuntos que demandam transparência, costumam tegiversar. E poucos são os mandatários conscientes de quem é seu verdadeiro chefe.
É o povo. A sociedade. O eleitor. E é a eles - acima de qualquer outra instância - que esses políticos devem satisfações sobre suas ações. Principalmente quando envolvem dinheiro público, arrecadado com impostos suados pagos pelo contribuinte.
Hoje à tarde, o presidente estadual do PSB, Milton Coelho, confirmou esse exemplo, ao recusar-se novamente a revelar quanto o partido gastou com a organização, produção e divulgação da festa oferecida ao presidente Lula ontem, no Recife antigo. Festa encomendada, é bom que se diga, pelo governador Eduardo Campos, presidente nacional do PSB, para agradecer pela atenção do aliado petista a Pernambuco nos seus oito anos de mandato.
No entendimento de Milton Coelho - prefeito do Recife em exercício, substituindo João da Costa (PT), licenciado - o PSB só tem obrigação de prestar contas ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE), e tem prazo até abril de 2011 para tanto.
Está certíssimo, prefeito! Pela lei, é da competência exclusiva da Justiça Eleitoral analisar e julgar as contas dos partidos políticos com gastos do Fundo Partidário. Mas essa é apenas a questão legal. Não se pode, porém, jogar o aspecto do mérito na lata de lixo. Se um político ou uma agremiação política primam, verdadeiramente, pela transparência - e não apenas a utilizam como peça de retórica - deveriam exercê-la com plenitude.
Fala-se em um custo de R$ 162 mil. Há algum mistério nesse orçamento? Algum gasto foi irregular? É provável que não, afinal, como partido líder da aliança que governa o Estado, o PSB deve, e tem dado exemplo de retidão nas suas prestações de contas.
A mega-festa para o presidente Lula, no Marco Zero, é bom frisar, foi justa e merecida. Até porque, nunca antes na história deste Estado se viu tanto investimento e apoio do governo federal a obras e ações que beneficiam a população. Foi uma bela noite de forró e muita emoção, tanto para o homenageado como para quem compareceu. Muitos artistas populares, muita animação, música excelente.
Será que vale mesmo a pena arranhar esse cenário por tão pouco, com essa inexplicável resistência em informar ao povo quanto ele - o povo - pagou pela festa?
* Foto: Hélia Scheppa/JC Imagem
terça-feira, 30 de novembro de 2010
Quem precisa de terapia?
Final de mandato, para muitos políticos, costuma representar um alívio. Mas para o presidente Lula, a expectativa de passar a faixa adiante parece estar se transformando num elemento de desequilíbrio profundo. Só isso poderia explicar o destempero e o comportamento bipolar a cada aparição pública.
Hoje cedo, no Maranhão, Lula voltou a protagonizar cenas no mínimo indignas do cargo. Questionado por um jornalista se seria grato pelo apoio que recebeu da "oligarquia dos Sarney" ao longo do seu governo, o presidente descompensou: além de classificar a pergunta de "preconceituosa", ainda mandou o repórter "se tratar, fazer psicanálise".
Na realidade, é o presidente quem parece estar sofrendo de algum transtorno psíquico. Amnésia, para dizer o mínimo. De que outra maneira ele poderia justificar a veemente defesa que faz agora dos Sarney, depois de tantas denúncias e escândalos envolvendo todo o clã?
Lula parece ter esquecido, por exemplo, dos indiciamentos do filho mais velho do coronel maranhense, o empresário Fernando Sarney. Seja por formação de quadrilha, tráfico de influência e falsificação de documentos, seja por envio de dinheiro ilegal ao exterior.
E o que dizer dos outros filhos do coronel? Será que Lula esqueceu da condenação do deputado federal Zequinha Sarney pela Justiça Eleitoral por propaganda antecipada em 2006? Ele virou ficha-suja e foi proibido de disputar a reeleição este ano, mas misteriosamente o TRE do Maranhão voltou atrás alguns dias depois, liberando o registro da candidatura.
Ah, presidente, o senhor também não lembra do escândalo Lunus? Aquele que detonou a candidatura de Roseana Sarney à Presidência da República, em 2002, e ainda terminou por causar sua derrota na disputa pelo governo do Maranhão quatro anos depois.
Seria bom relembrar a Lula que, atendendo a um pedido de Fernando Sarney, o desembargador Dácio Vieira, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, proibiu o jornal O Estado de S. Paulo de publicar notícias sobre seu indiciamento, restabelecendo no Brasil uma prática de censura que não se via desde o regime militar. Embora medidas dessa natureza pareçam contar hoje com a simpatia de alguns setores petistas.
Mas ao defender José Sarney, presidente Lula, o senhor parece que esqueceu mesmo de uma famosa frase: "Ademar de Barros e Paulo Maluf podiam até ser ladrão, mas eles eram trombadinha perto do grande ladrão que é o governante da Nova República, perto dos assaltos que faz”.
A ausência de plurais dá uma pista sobre quem fez a declaração, não? Se você disse Lula, acertou. O desabafo aconteceu em 1987, num improvisado discurso em Aracajú, quando o então presidenciável petista não escondia o "ódio" pelo clã dos Sarney.
Mas hoje cedo, no Maranhão, a declaração foi bem outra. A um mês de desembarcar na planície, e certo de que já não precisa mais das atenções da imprensa como em 1987, Lula afagou publicamente os Sarney, agradecendo pelo apoio à sua administração. E vociferou contra o repórter que o questionou:
"Sua pergunta preconceituosa é grave para quem está há oito anos comigo em Brasília. Significa que você não evoluiu nada do ponto de vista do preconceito, que é uma doença. Sarney é o presidente do Senado. E colaborou muito para que a institucionalidade fosse cumprida. Você devia se tratar, quem sabe fazer psicanálise, para diminuir um pouco esse preconceito".
Depois dessa, só resta à imprensa brasileira despedir-se e agradecer a atenção dispensada, presidente Lula.
segunda-feira, 15 de novembro de 2010
Os leões de Dilma
Deve começar bem agitada a semana da presidente eleita Dilma Rousseff (PT), que voltou da Coréia do Sul no sábado passado. Ao retomar os trabalhos de transição e as costuras para compor sua futura equipe, ela terá que matar o primeiro leão antes mesmo de assumir o poder. Trata-se da acirrada disputa por cargos entre o PMDB – que não abre mão dos seis ministérios que ocupa hoje no governo Lula – e o PT, que cobiça pelo menos dois deles: Saúde e Comunicações.
E este é só o começo. Depois do crescimento vertical nas urnas, o PSB do governador Eduardo Campos também pleiteia ministérios de peso. Embora oficialmente os socialistas insistam que não condicionam apoio a cargos, nos bastidores já mandaram o recado: não vão mais se contentar com pastas de pouca evidência, como a da Ciência e Tecnologia.
No alvo do PSB estão, no mínimo, dois ministérios importantes: Integração Nacional e Cidades. O primeiro está atualmente na cota dos peemedebistas. O outro, nas mãos do PP, que não só deseja mantê-lo como sonha em ampliar seus espaços.
Além dos leões mais vorazes, Dilma ainda terá que afagar os menos famintos, como o PDT, o PCdoB e o PR, com bancadas parlamentares expressivas. Mas com um padrinho político experiente como o presidente Lula, é provável que ela tenha sido bem preparada para isso. Afinal, ninguém melhor que Lula para advertir que depois de cada eleição os leões podem até demorar, mas sempre aparecem para cobrar a fatura.
* Texto publicado na coluna Cena Política, do JC, em 15/11/2010
quinta-feira, 11 de novembro de 2010
Em bom português...
Francisco Everardo Oliveira Silva sabe ler e escrever. Bem ou mal, não importa. Importa o fato de que ele não é analfabeto e, portanto, está apto a receber o diploma de deputado federal, mandato que lhe foi conferido, em outubro passado, por cerca de 1,3 milhão de eleitores de São Paulo.
Hoje pela manhã, no Tribunal Regional Eleitoral, Francisco Everardo leu dois títulos e dois subtítulos de um jornal. Depois, escreveu uma frase com 18 palavras, ditada por um juiz e retirada do livro "Justiça Eleitoral, uma retrospectiva". O teste levou pouco mais de três horas para ser realizado. Mas, é daí? Fez o que pediram. Comprovou que sabe ler e escrever, conforme afirmou em sua inscrição no pleito de outubro.
Famoso por seu desempenho artístico, Francisco Everardo recebeu 1.353.820 votos. Na história eleitoral de São Paulo, ficou atrás apenas do já falecido Enéas Carneiro (Prona), que abocanhou quase 1,5 milhão de votos.
O detalhe é que o doutor Enéas era figurinha carimbada na política, com três candidaturas presidenciais nas costas quando disputou a Câmara dos Deputados, e com sua votação - graças à matemática eleitoral perversa adotada pela legislação brasileira - arrastou consigo mais cinco deputados do Prona. Todos com menos de mil votos nas urnas.
Francisco Everardo, por sua vez, não sabia sequer o que vinha a ser filiação partidária quando, em setembro de 2009, foi convidado a ingressar no PR para ser candidato a deputado federal.
A estratégia dos caciques funcionou bem: eleito, Francisco Everardo arrastou consigo outros três novos parlamentares. Entre eles, o delegado da Polícia Federal Protógenes Queiroz (PCdoB). Que mesmo com a notoriedade nacional do comando da Operação Satiagraha, que prendeu o banqueiro Daniel Dantas e outros acusados de fraude, só obteve 94.906 votos nas urnas. Sua sorte foi o PCdoB estar coligado ao PR do campeão de votos.
Com todos esses detalhes, ainda não sabe de quem estamos falando? Então, vai a última pista. O slogan de Francisco Everardo virou notícia no País inteiro: "Vote no Tiririca, porque pior que tá, não fica!" Pois é, trata-se do palhaço, malabarista, cantor, compositor, humorista e, agora, deputado federal Tiririca. Que depois de receber os votos de mais de 1,3 milhões de eleitores, enfrentava a ameaça de cassação sob suspeita de ser analfabeto, o que é proibido por lei aos candidatos a cargos públicos.
Na realidade, o problema não está no candidato, mas na lei que rege as eleições. Que de tão frouxa e cheia de brechas, permite a inscrição de postulantes como Tiririca. Não concordo que ele seja a cara do nosso Congresso Nacional, como andam dizendo por aí. De fato, nem todos são palhaços ali. Mas se Tiririca teve a candidatura homologada pelo TRE, fez campanha livremente e foi sufragado nas urnas, tem o mesmo direito de assumir o mandato que os demais 512 colegas deputados.
Principalmente agora, quando a Justiça Eleitoral constata que ele, bem ou mal, sabe ler e escrever. Sem falar que a manutenção do mandato de Tiririca respeita a vontade soberana do eleitor. Não interessa se votou bem ou mal. Votou nele.
Resta esperar, portanto, que o mais novo político brasileiro cumpra a promessa repetida tantas vezes nos programas do guia eleitoral de TV, quando, com ar humilde, dizia: "O que faz um deputado federal? Na realidade, eu não sei. Mas vote em mim que eu te conto". Então conta, Tiririca.
segunda-feira, 8 de novembro de 2010
Enem aí!
Na época em que prestei vestibular, o exame era unificado. O estudante fazia apenas uma prova para disputar as vagas nas universidades Federal e Católica. Foi um suplício.
Não que não estivesse preparado, mas o clima de terror que se cria em torno do vestibular sugere que virar noites, frequentar aulas dirigidas e estudo em grupo, quebrar a munheca de tanto repetir testes, perder o lazer e as festas com família e amigos não vale de nada na hora da prova. O "fera" fica nervoso, gelado. Uma sensação de insegurança que, na maioria das vezes, passa nos primeiros minutos. Mas para outros, infelizmente, só piora.
Por isso fiquei feliz em ver o "unificado" ser substituído pelo formato "peneirão", seguido das provas específicas. Mas mudou o governo, e como sempre acontece neste País, tinham que mexer em alguma coisa. Quando inventaram o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), foi como se tivessem ressuscitado o danado do "unificado". Só que num grau bem maior de incompetência por parte de quem formula e de quem aplica as provas.
Não fosse assim, o Enem não frequentaria as manchetes negativas dos jornais todo ano. E dá pena ver a expressão de ansiedade dos "feras". Não por se sentirem despreparados, mas por não ter a certeza de que seu esforço vai dar em algo. Simplesmente pagam o pato pelos vacilos dos organizadores. E mais uma vez, o que se viu foram vacilos. Na logística, na impressão das provas e na repetição de erros menores que há muito deveriam ter sido corrigidos.
Aliás, o processo de seleção das universidades há muito já deveria ter sido radicalmente modificado, com o fim dos vestibulares e a aceitação de alunos mediante a avaliação de notas recebidas ao longo da sua vida estudantil. Esse sim, seria um processo estimulante desde o tenro início e, de fato, selecionaria as melhores cabeças para as melhores universidades.
Nos últimos anos, o Brasil deu passos largos em vários aspectos da vida social. Mas nesse caso específico do Enem, lamentavelmente continua andando para trás.