quinta-feira, 28 de abril de 2011

Tábua de salvação















O Brasil de hoje tem 28 partidos inscritos formalmente no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sem falar nos outros que aguardam a apreciação do seu pedido de registro. De todos estes, seis ou sete podem ser realmente levados a sério. Os demais, ou são verdadeiros balcões de negócios ou não representam nenhum grupo ou setor da sociedade. São blocos do "eu sozinho".


A permissividade da atual legislação é a grande responsável por esse excesso que, ao contrário de ajudar, só atrapalha a construção de uma democracia séria no País. A regulamentação de uma nova lei dos partidos políticos é um dos itens mais urgentes e necessários na pauta de uma eventual reforma política. Digo eventual porque, por mais que seus defensores se esforcem, ainda não acredito que ela venha a se concretizar. Pelo menos não da forma como a sociedade deseja.

Mas independente de qualquer reforma que venha a ser votada no Legislativo, um outro tipo de mudança está sendo negociada, e se consolidada, terá um impacto razoável no cenário político. É a fusão do PSDB com o DEM. Os dois partidos governaram juntos o País por oito anos, e há oito anos dividem a oposição ao governo petista.

Essa condição de opositor enfraqueceu as duas legendas, mas machucou muito mais os demistas que os tucanos. Descendente de uma árvore genealógica totalmente adversa ao modelo de centro-esquerda adotado pelo PSDB, o DEM traz no sangue sinais genéticos da Arena, do PDS e do PFL, ainda que tenha deixado pelo caminho parte do conservadorismo dos ancestrais.


Historicamente falando, também não ajudou o fato de o DEM - ou seu antecessor PFL - ter se colocado como coadjuvante do poder. À exceção do ex-vice-presidente Aureliano Chaves, o partido nunca encabeçou uma chapa na disputa presidencial, optando pela vice do PSDB em 1994 e 1998. Em 2002, o PFL sequer esteve representado em alguma chapa. Simplesmente apoiou a dobradinha PSDB-PMDB.

Em 2006, o DEM reassumiu seu papel tradicional, na vice da chapa do tucano Geraldo Alckmin. Em paralelo foi, aos poucos, perdendo também o domínio político nos Estados.


Aquele PFL que na primeira eleição direta pós-golpe militar, em 1982, elegeu quase todos os governadores brasileiros - inclusive os dos nove Estados do Nordeste - em 2006 só conquistou o governo do Distrito Federal, José Roberto Arruda. Aí veio o escândalo do mensalão, Arruda renunciou e o partido perdeu o único comando estadual que tinha.

Em 2010, num esboço de reação, o DEM elegeu dois governadores: Rosalba Ciarlini (RN) e Raimundo Colombo (SC). Mas hoje o catarinense está de malas afiveladas para cair fora. Isso sem falar na redução significativa das bancadas parlamentares na Câmara dos Deputados - que já foi a mais numerosa -, no Senado e nas assembleias estaduais.


Diante desse retrato cruel, mas realista, a proposta de fusão com o PSDB pode até não ser tão vantajosa para os tucanos. Mas com certeza seria o caminho da salvação para os ex-pefelistas.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

O PMB de Eduardo













A política é feita de ciclos, alguns muito semelhantes, ainda que décadas os separem. É o caso do Partido Social Democrático (PSD), fundado há cerca de um mês pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, e avalizado de pronto pelo presidente nacional do PSB, governador Eduardo Campos.


Em Pernambuco, o PSD deverá representar para Eduardo o que o extinto Partido Municipalista Brasileiro (PMB) significou para o seu avô, Miguel Arraes. Em 1988, ainda ligado ao PMDB, o governador Arraes recebia inúmeros pedidos de filiação ao partido de pretensos candidatos a prefeito e vereador em todo o Estado. Visando evitar o inchaço do PMDB local, ele direcionou essas filiações para o PMB, comandado pelo senador Antônio Farias, seu companheiro de chapa em 1986.

Um quadro bem parecido se desenha agora para Eduardo Campos. É no PSD que o governador deve posicionar boa parte dos seus candidatos a prefeito e vereador em 2012, evitando crescimento exagerado do PSB. Não é à toa que, assim como Arraes fez com Farias e o PMB, Eduardo apadrinhou a filiação do ex-deputado André de Paula (ex-DEM) ao PSD, e ainda lhe entregou a presidência local do partido. Tudo muito semelhante...


* Texto publicado na coluna Cena Política, em 25/04/2011

terça-feira, 19 de abril de 2011

Pessedismo de roupa nova













Certa vez, li uma definição interessante para a expressão "pessedismo": o exercício da moderação e do equilíbrio, que gera a capacidade de sobreviver sempre, tão perto do poder quanto possível. Na ocasião, estava sendo descrito o velho pessedismo, linha política da qual foram adeptos vários personagens históricos, a exemplo dos ex-presidentes Juscelino Kubitschek e Eurico Gaspar Dutra, e em Pernambuco, os ex-governadores Agamenon Magalhães e Miguel Arraes.


O velho Partido Social Democrático (PSD) foi fundado em 1945, sob os auspícios do então presidente Getúlio Vargas, que queria ampliar sua base de sustentação e garantir proteção contra os ataques da conservadora UDN. Para isso, tratou de solidificar no PSD o apoio das elites municipais, os chamados "coronéis", interessados em se manter dentro do círculo de poder. Anos depois, quando o golpe militar de 64 extinguiu a legenda, expôs seu "ecletismo". Enquanto parte dos filiados migrou para o MDB - de oposição aos generais - outra parte buscou abrigo sob o guarda-chuva da Arena governista.

Quase 70 anos depois, o fantasma do pessedismo é invocado das profundezas pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab. Embora com raízes fincadas no DEM, ex-PFL, ex-PDS e ex-Arena, Kassab revelou um jogo de cintura bem pessedista logo nas primeiras costuras do novo partido. Com a tradicional simplicidade com que os políticos costumam justificar seus atos, explicou que pretende fazer uma "oposição responsável" à presidente Dilma Rousseff (PT), "criticando o que considerar errado e elogiando o que for correto".

Curioso é como o discurso pessedista ainda tem o poder de "abrandar" o fogo das oposições. Hoje, Kassab tem como principal aliado e conselheiro o presidente nacional do PSB, Eduardo Campos. Mas o respaldo do governador de Pernambuco não é gratuito. Muito pelo contrário. Raposa política, Eduardo já joga com a hipótese de fundir o PSD ao PSB, ampliando sua força política no País para o projeto maior dos socialistas em 2014.

Mais curiosos ainda são alguns nomes que poderão vir a cerrar fileiras com Kassab e, por consequência, com Eduardo Campos. Já estão de malas prontas para ingressar no PSD figuras como a senadora Kátia Abreu (DEM-TO) - líder da bancada ruralista e duríssima adversária de DIlma e do MST -, o vice-governador baiano Otto Alencar (PP), eleito na chapa do petista Jaques Wagner, e o vice-governador de São Paulo Guilherme Afif Domingos (DEM), companheiro do governador tucano Geraldo Alckmin.

E Pernambuco não poderia ficar ausente do novo pessedismo. O comando local do partido será entregue ao ex-deputado federal André de Paula, que por longos 17 anos presidiu o PFL estadual e atuou no alto comando da oposição a Miguel Arraes e ao seu neto, o atual governador. Eduardo Campos, agora, tornou-se padrinho da filiação do ex-adversário ao PSD, deixando claro, mais uma vez, o dote pessedista que herdou do avô.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

No bolso do paletó










Quem é mesmo esse povo que os deputados estaduais representam no poder? Seria aquele cidadão que acorda cedo, chacoalha pendurado em ônibus invariavelmente lotados e dá duro seis dias por semana para garantir um salário mínimo no fim do mês?


Ou seria aquele cidadão usuário de um sistema de saúde pública precário - para dizer o mínimo - com longas filas nas emergências e consultas médicas marcadas às vezes com até um ano de antecedência?

Poderia ser ainda aquele cidadão dependente de um sistema de educação pública capenga, ultrapassado, com professores pouco capacitados e mal-remunerados, e sem condições de sequer sonhar com seus filhos na universidade?

Quem, na classe média, ousaria bater no peito e se dizer representado por esses senhores, que legislam diuturnamente em causa própria, criando dispositivos que lhes permitam embolsar mais e mais recursos públicos, quando praticamente a metade dos cidadãos que pagam impostos não têm dinheiro que sobre no final do mês?

Você se sentiria representado por um político que, para aprovar um projeto de interesse do Estado, precisa ser bajulado pelo Executivo e ter uma série de exigências atendidas, sob a ameaça de simplesmente "desaparecer" na hora da votação?

Pois bem. Esse é o retrato da atual Assembleia Legislativa de Pernambuco. Como de resto, de outras tantas casas legislativas pelo País afora. A situação chegou a um ponto de insustentabilidade que está levando entidades da sociedade civil a se mobilizarem para interferir, na tentativa de deter a voracidade dos parlamentares e fazê-los enxergar que nem tudo é mordomia no Poder.

No momento, a seccional pernambucana da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PE) decidiu dar combate a um antigo absurdo cometido pelos deputados com o dinheiro do imposto nosso de cada dia: o "auxílio-paletó".

O benefício - que consome cerca de R$ 2 milhões anuais dos cofres públicos - foi assim apelidado porque inicialmente previa uma ajuda de custo para que cada um dos 49 deputados pudesse se vestir condignamente para o trabalho de representar o povo.
Porém, como tudo o mais no Legislativo, o auxílio-paletó foi distorcido. Passou a ser pago indistintamente - inclusive aos suplentes que porventura assumam a vaga durante apenas alguns meses - e sem a necessidade de prestação de contas pelo beneficiário.

Hoje, o auxílio-paletó garante a cada parlamentar pernambucano pelo menos mais dois salários mensais ao ano, um no início e outro ano final de cada período legislativo. E é sempre bom lembrar o valor do salário de um deputado estadual - calculado em 75% da remuneração de um deputado federal: R$ 20 mil.

O 14º e o 15º salários dos senhores deputados, pagos sob o título de auxílio-paletó, é mais uma mordomia acrescida a uma lista que já não é pequena, que inclui outros tantos "vales", "verbas" e "auxílios".

Se mesmo diante de tudo isso, uma parte da sociedade consegue enxergar identidade entre um deputado estadual e o cidadão que ele supostamente representa no poder, a outra parte - ainda capaz de se indignar - deve estar precisando usar óculos.