quinta-feira, 28 de maio de 2009














Uma boa chance de calar

O deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) tem, realmente, o direito irrevogável de se expressar. Mas de forma elegante. Caso contrário, coloca-se numa posição que pode ser analisada por dois prismas distintos: ao afixar na porta do seu gabinete um cartaz tratando em tom irônico um assunto tão sério como a vida das pessoas, ou será tomado por agressivo e revanchista, ou por ridículo.

O cartaz a que me refiro é aquele que apareceu na porta do gabinete de Bolsonaro, com a imagem de um cão e os dizeres: "Quem procura osso é cachorro". O parlamentar refere-se aos ex-guerrilheiros do Araguaia, desaparecidos sob o regime de exceção.

Único deputado ainda a defender - ao menos abertamente - as boas intenções dos militares ao implantarem a ditadura no Brasil em 1964, Bolsonaro sempre optou pela polêmica e pelo confronto, e menos por uma argumentação sólida e justificável. Mas dessa vez, incorreu no puro desrespeito. Afinal, queira ele ou não, há famílias que até hoje procuram os corpos - ou os ossos - dos seus parentes, torturados e mortos pela repressão.

Juízos ideológicos à parte, ao produzir uma peça publicitária - se é que pode se chamar assim - tão agressiva, ele só contribui para piorar a sua própria imagem. Sem falar que contribui para produzir mais um fato negativo a ser acumulado na imagem de um Parlamento já tão enfraquecido e desgastado.

Ou alguém duvida que a intenção do deputado-militarista não foi a de trocar farpas com seus colegas do PCdoB, defensores de uma apuração rigorosa dos fatos ocorridos no Araguaia no início da década de 70? Pois ele conseguiu. Ainda ontem, movimentos ligados ao tema, como o Tortura Nunca Mais, e deputados da esquerda, apresentaram representações e queixas aos dirigentes da Câmara, pedindo providências.

Não vai adiantar muito. Porque é graças exatamente à luta das esquerdas e dos movimentos sociais que gente como o deputado Jair Bolsonaro conquistou, hoje, o direito de se expressar livremente. Ao contrário do que acontecia época em que os "aliados" do parlamentar mandavam no País, quando ninguém podia dar um pio sobre nenhum assunto polêmico, sob risco de também terminar "desaparecendo", como aconteceu com os guerrilheiros no Araguaia e em tantos outros lugares.

quarta-feira, 27 de maio de 2009
















Mais uma no arquivo

O resultado era o esperado. Os deputados engavetaram mais uma vez, ontem, uma proposta de reforma política que iria ser votada na Câmara. Dessa vez, a explicação é a de que não houve acordo entre os partidos sobre a criação do voto em lista fechada, pelo qual o eleitor vota na legenda, e não diretamente no seu candidato.

Na realidade, porém, o engavetamento de mais uma tentativa de aprimorar o falido sistema eleitoral brasileiro aconteceu por interesses políticos. Dos próprios políticos, claro. Diante das discordâncias entre os partidos da base aliada do governo Lula, os líderes entenderam que se o projeto fosse colocado em pauta poderia causar abalos e comprometer as alianças eleitorais em 2010. Atrapalhando, por conseguinte, o projeto de manutenção do poder nas mãos do atual bloco governista.

Traduzindo em linguagem popular: pela terceira vez, os deputados pensaram neles próprios - e no chefe -, deixando de lado os interesses da sociedade, que já não aguenta mais o atual sistema político-partidário, nocivo para a sociedade, embora benéfico para os detentores de mandato. Da forma como funciona hoje, ele impede a renovação, desejada por tanta gente que quer ver mudanças profundas na cara do atual Congresso Nacional, desgastado e desmoralizado por infinitos escândalos.

Infelizmente, essas mudanças dependem exatamente da aprovação do Congresso, e embora alguns parlamentares se esforcem para que elas aconteçam, são absoluta minoria. A ampla maioria continua mesmo é interessada em proteger o status quo, que assegura maiores chances de renovação do mandato.

O mais grave é que o Legislativo atual sequer legisla. De escândalo em escândalo, de CPI em CPI, vão empurrando com a barriga os cerca de mil projetos que aguardam a pauta para ser votados. E um dos argumentos - ou melhor dizendo, ameaças - da bancada de oposição, favorável à votação da reforma política, foi a de obtruir a votação de projetos do governo, caso a proposta fosse engavetada. A resposta governista veio no mesmo tom: se a reforma entrar na pauta, vão obstruir as votações.

Ou seja, de um lado e de outro, a ordem é paralisar os trabalhos. Uma redundância. Afinal, com tantas denúncias e tantas picuínhas políticas, há muito tempo já não se vota nada relevante para a vida do cidadão naquela Casa. Que a cada dia que passa, perde mais e mais importância junto à sociedade.

segunda-feira, 25 de maio de 2009














Pesadelo collorido

Difícil a situação de quem esteve fora do Brasil por uns quinze ou vinte anos, e voltou agora. Pelo menos no campo da política, vai tomar um susto após o outro. Domingo passado, o ex-presidente Fernando Collor de Mello - hoje senador Pelo PTB de Alagoas - deve ter surpreendido muita gente na entrevista que concedeu ao programa Canal Livre, da Band.

Collor não quis falar muito do seu governo. Ainda demonstra mágoas pela renúncia, forçada para tentar escapar ao processo de impeachment deflagrado após as denúncias de corrupção. Evitou o tema PC Farias e as investigações da CPI no Congresso Nacional. Preferiu ater-se aos temas atuais. Em certo momento, fez uma defesa veemente do Parlamento, do qual faz parte, criticando as generalizações das acusações de corrupção e condenando a tese do fechamento da Casa, apregoada pelos mais radicais.

É bom lembrar que quando estava no Palácio do Planalto, Collor tratava o Congresso a pão e água. Raramente recebia parlamentares, não negociava projetos com a Casa e ignorava pedidos de nomeações e de liberação de verbas. Governava como se não precisasse do Legislativo. Foi um dos motivos que contribuíram para a sua queda.

Abandonando aquela postura arrogante que tornou-se sua marca registrada, o ex-presidente reconheceu o erro. Admitiu ter desprezado os frequentes conselhos de ministros e líderes partidários para que desse mais valor ao Parlamento e afirmou que somente agora, como senador, tem a noção exata da importância das duas Casas.

Noutro momento de causar espanto aos mais desavisados, Collor praticamente jurou fidelidade ao presidente Lula. Aquele mesmo petista a quem impôs uma derrota humilhante na disputa presidencial de 1989, e contra cujo partido vociferou cobras e lagartos ao longo de todo o processo de impeachment.

De volta à vida pública após 14 anos, o senador alagoano agora é fiel aliado, e por isso mesmo foi premiado pelo governo petista com a presidência da Comissão de Infra-Estrutura do Senado, na qual promete agir como uma espécie de copiloto do Programa de Aceleração do Crescimento, auxiliando a ministra Dilma Rousseff, a gerente do PAC.

Dilma, aliás, foi citada por Collor várias vezes na entrevista como o melhor nome para suceder Lula em 2010. Se alguém dormiu por tantos anos e acordou na noite do domingo passado, certamente pensou estar tendo um grande pesadelo.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

















Golpismo de terceira


Ninguém segura a desmedida ambição eleitoreira de alguns políticos. Dia após dia surgem novos exemplos de gente insistindo em aplicar a Lei de Gérson, ignorando as necessidades do País ou da sociedade e pensando tão somente nos seus dividendos pessoais.

A bola da vez é o deputado sergipano Jackson Barreto (PMDB), que, minimizando o desgaste do Legislativo, insiste em colher assinaturas para apresentar sua proposta de emenda à Constituição garantindo um terceiro mandato para o presidente Lula.

A discussão desse assunto já deveria ter sido encerrada meses atrás, quando outro deputado sugeriu a idéia e dela foi demovido por interlocutores presidenciais. Mas o carisma e a popularidade de Lula são uma moeda tão valiosa que é impossível para alguns políticos - mais acostumados a levar vantagem em tudo - ficarem indiferentes.

O País já assistiu a um filme semelhante, há pouco mais de dez anos, quando uma emenda de mesmo teor mudou a Carta Magna em cima da hora, permitindo que o então presidente Fernando Henrique Cardoso disputasse um novo mandato. Na época, a emenda da reeleição já gerou polêmica, cercada de denúncias de venda de votos e outros delitos parlamentares. Mas concedia ao presidente apenas uma segunda chance. E terminou aprovada.

Barreto, agora, quer dar a Lula uma permanência de 12 anos no poder. Iniciativa semelhante, nos últimos tempos, só aconteceu na Venezuela do caudilho Hugo Chávez. Com a cara mais lavada, o parlamentar justifica a manutenção da proposta - criticada até por deputados do próprio PT - sob o argumento de garantir que, no caso de a ministra Dilma Rousseff, virtual candidata petista à sucessão, ficar impedida de concorrer por causa da doença, o poder não mude para as mãos da oposição.

Segundo o deputado reelecionista, somente Dilma tem condições eleitorais de assegurar a continuidade do governo. E na sua impossibilidade, seria melhor mantê-lo com Lula, único, segundo ele, com condições de vencer os tucanos nas urnas do próximo ano. Na verdade, porém, o que Jackson Barreto quer mesmo é um discurso pessoal para 2010. Empunhando a bandeira de "autor da emenda que deu a Lula o terceiro mandato", pretende disputar o governo de Sergipe, Estado onde a popularidade do presidente é muito alta.

O espantoso é que o deputado já conseguiu mais de 171 assinaturas de colegas parlamentares, número mínimo necessário para sua PEC tramitar. Embora seja uma prática no Congresso Nacional assinar pela tramitação e, depois, votar contra, quem pode prever - com um Legislativo fisiológico e adesista como o atual - os resultados de uma votação como essa?

Vai que os ilustres congressistas resolvem surpreender o País com uma decisão chavista? Em se tratando do Parlamento - e do presidente Lula - tudo pode acontecer. Inclusive nada.


terça-feira, 19 de maio de 2009














O circo das CPIs

Os integrantes da atual legislatura no Congresso Nacional parecem mesmo ter jogado a toalha, no que se refere ao resgate da principal função da Casa, a de legislar. Não é a toa que os congressistas se preparam para mais uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). Dessa vez tendo como alvo as denúncias de superfaturamento na Petrobras.

Que as CPIs são um instrumento previsto na Constituição, é fato. Como é fato que faz parte das tarefas do parlamentar fiscalizar o governo e o bem público. Mas não vão convencer ninguém de que essa CPI da Petrobras tem caráter de fiscalização.

E nesse ponto, é preciso concordar com o presidente Lula, quando afirma que a proposta de investigação que ora toma todo o espaço de discussão no Congresso tem um único objetivo: enfraquecer o palanque governista para 2010. Nem que isso afaste ainda mais os parlamentares das votações de matérias importantes para o País, pendentes nas quilométricas pautas trancadas nas duas Casas.

Não que Lula também não pense 24 horas por dia na sua própria sucessão. Pensa. Mas num momento em que o Legislativo fica exposto, diante da sociedade, tão enfraquecido, desgastado e desmoralizado pelos inúmeros escândalos que protagoniza, o resgate da atividade de produzir leis – sua prerrogativa essencial – bem que poderia ser retomado.

Em vez disso, a oposição leva o debate para o lado político, propondo a CPI da Petrobras sem, sequer, procurar outros instrumentos que poderiam analisar as denúncias feitas contra a empresa. O Ministério Público, por exemplo, poderia ser acionado.

O presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, se dispôs a depor diante de três comissões do Senado. Não seria mais viável aguardar as explicações do controlador da empresa antes de montar mais uma lona lotada de holofotes para o grande circo que são as CPIs no Brasil?

Até porque, num levantamento rápido é possível constatar que muito poucas delas produziram resultados satisfatórios. Quem não lembra do mensalão? A maioria das CPIs – na Câmara, no Senado ou mistas – terminou esvaziada pelo governo ou arquivada por falta de conclusões.

Mas os senadores insistem, conscientes que o resultado das investigações é o que menos importa. O que vale, mesmo, é ter à mão – às vésperas do período eleitoral – mais um instrumento político para dar impulso na mídia à briga pelo poder.


segunda-feira, 18 de maio de 2009















Receita para trancar escândalos


A iniciativa do senador Marco Maciel (DEM-PE) de propor a retirada das medidas provisórias da Constituição Federal deve gerar polêmica no Congresso Nacional. Embora critique as MPs por trancarem as pautas de votação, a bancada governista deve resistir à proposta, que enfraquece o poder do presidente Lula, acostumadíssimo a “legislar” por meio desse instrumento.

A justificativa de Maciel é simples, baseada no dito popular “cabeça vazia é oficina do diabo”. Traduzindo: com as pautas obstruídas e sem condições de legislar, muitos deputados e senadores terminam se ocupando com ações pouco dignas à postura parlamentar. A ideia é dar a eles o que fazer, ajudando a corrigir os desvios de conduta.

O senador tem uma justificativa difícil de se contrariar. Na atual Constituição, há um dispositivo que garante ao presidente da República a prerrogativa de enviar projetos de lei em caráter de urgência ao Congresso, em vez de MPs. A Casa, por sua vez, teria a obrigação de votá-los em até 45 dias. Caso contrário, eles passam a obstruir a pauta.

Só que, como argumenta o próprio Maciel, as MPs são mais cômodas para Lula, que entram em vigor assim que são publicacadas, deixando para depois a aprovação no Legislativo. Isso, porém – alerta o senador – gera insegurança jurídica no País. Porque basta que uma MP seja alterada na Câmara ou Senado, depois de publicada, para mexer com uma lei que já estará em vigor, ainda que temporariamente.

* Texto publicado na coluna Cena Política, do Jornal do Commercio - 18/05/09

sexta-feira, 15 de maio de 2009


















Raposismo petista

Na política, como na guerra, é preciso escolher bem os aliados. Alguns, uma vez no poder, podem tornar-se tão perigosos ao ponto de atrapalhar uma estratégia bem montada, em vez de contribuir para sua boa execução.

É o que acontece hoje com o PT em Pernambuco. Aliado de primeira hora do governador Eduardo Campos (PSB), com a proximidade das eleições - nas quais o governador pretende tentar a recondução ao cargo - os petistas, mais uma vez, voltam-se para o próprio umbigo, pensando muito mais nas suas intermináveis disputas internas que num projeto maior de manutenção e ampliação do poder no Estado.

A grita que ora surge no partido pela substituição do vice-governador João Lyra (PDT) na chapa de Eduardo nada mais é que uma continuação da batalha sem trégua entre os grupos petistas liderados pelo secretário estadual das Cidades, Humberto Costa, e pelo ex-prefeito do Recife, João Paulo. Os dois, que há duas décadas disputam a hegemonia da sigla, ficam cegos para qualquer outro tema quando se trata de anular as forças do rival.

Nesse mais recente episódio, o que se percebe é uma tentativa do grupo de Humberto de neutralizar o favoritismo de João Paulo na disputa por uma vaga na chapa encabeçada pelo PSB. Ao clamar por um debate em torno da vice, já praticamente definida pelo governador novamente para João Lyra, os adversários do ex-prefeito tentam forçar a rediscussão do nome majoritário do PT.

Eduardo Campos, indiretamente, mandou um recado curto e grosso aos aliados: é ele, e apenas ele, quem coordena o processo. E não permitirá que desavenças internas em um dos partidos prejudiquem todo o projeto de preservação do comando do Estado.

Ao mesmo tempo em que era divulgada a nota do governador por porta-vozes do PSB, João Paulo fazia um rápido movimento de defesa e contra-ataque. Retirou, momentaneamente, a sua pré-candidatura ao Senado, deixando para Humberto o ônus do desgaste com os socialistas.

Resguardando-se da gritaria dos adversários, o ex-prefeito neutraliza a investida sobre a sua postulação e expõe o outro lado do PT. Que embora mais próximo de Eduardo, aparece agora como o vilão do processo de desarticulação do palanque.

quinta-feira, 14 de maio de 2009















A culpa é de quem mesmo?

Seria estranho, se não estivéssemos falando da atual política no Brasil. País onde a opinião pública e a imprensa, de repente, são apontadas como os grandes vilões, bodes expiatórios dos desmandos. Pelo menos é o que parte dos congressistas quer nos fazer acreditar.

O episódio da substituição do deputado Sérgio Moraes, do PTB gaúcho, da relatoria do processo de quebra do decoro parlamentar contra o colega Edmar "dono do castelo" Moreira (sem partido-MG) tornou-se a arena onde os leões - no caso, os deputados do Conselho de Ética da Câmara - passaram a tentar devorar jornalistas e eleitores.

Depois de Moraes ter afirmado estar se lixando para o que pensa a opinião pública, e acusar a imprensa de distorcer suas declarações, vários parlamentares assumiram o mesmo tom. Passaram a culpar os meios de comunicação pelos escândalos registrados na Casa.

Ora, a imprensa tem se ocupado tão somente em divulgar o que acontece no Senado e na Câmara dos Deputados. E como por lá, ultimamente, só acontecem escândalos, crises e denúncias de corrupção e negociatas, os jornais só poderiam refletir o cotidiano dos congressistas.

É muito mais fácil culpar terceiros por seus próprios desvios. Mas diante da sucessão de desastres que vem marcando a rotina nas duas casas legislativas, vai ficando cada vez mais difícil convencer a opinião pública de que os congressistas não são os responsáveis por todos eles.

Bem ou mal, o País vem passando por mudanças, inclusive no modo dos eleitores encararem a política egoísta e suja, feita por quem foi colocado lá para representar o povo. E reafirmar insistentemente que não está preocupado com o que pensa a opinião pública só dará aos eleitos uma sobrevida menor no poder.

Tratar o eleitor como gado vai, sem dúvida, custar mais caro a partir do ano que vem. Ninguém duvide dos efeitos drásticos que as urnas podem revelar, diante do cenário obscuro exposto hoje no Congresso Nacional.

Nas eleições de 2006, o índice de abstenção foi de 16,75%. Mas em 2010, a esperança é de que, em vez de se ausentarem ainda mais, os eleitores – mais conscientes, graças, exatamente, à divulgação dos escândalos, e menos afeitos aos cabrestos impostos por tantos Moraes e Moreiras – compareçam em massa para dar o merecido troco.

Pena que o progresso seja mais lento do que deveria. Dada a dimensão continental do País, lamentavelmente alguns desses maus políticos ainda conseguirão se safar do prejuízo.

segunda-feira, 11 de maio de 2009
















A chance de Jarbas

A máquina pública é um excelente cabo eleitoral para quem está no poder e seus aliados. Culpa da atual legislação do País, frouxa, permissiva e cheia de brechas. Pior para quem não aproveitá-las. Não é o caso do governador Eduardo Campos (PSB), que tem conseguido tirar dividendos significativos da situação sem, no entanto, abrir flancos para ser atacado.

As sucessivas manifestações de apoio que o governador vem recebendo - sobretudo de prefeitos e lideranças de partidos adversários - nas suas visitas a municípios do interior do Estado, podem até irritar dirigentes oposicionistas, mas não são nenhuma novidade.Antes de Eduardo, outros fizeram o mesmo.

O que vai ou não diferenciá-lo dos demais é o uso político desse favorecimento. Por enquanto, o governador tem agido bem, minimizando publicamente os apoios recebidos para não melindrar a oposição, e deixando a cargo de interlocutores o trato dessas adesões nos bastidores, longe dos olhos da opinião pública.

Em nível nacional, não foi diferente com o presidente Lula, por exemplo, quando disputou a reeleição. Um governante com a popularidade alta, a máquina na mão e ciente das dificuldades dos prefeitos em conseguir recursos para obras nas suas cidades, só não se projeta se errar feio nas articulações.

A regra é se dar bem com tudo isso. Mas já houve exceções. Recentemente, a própria União por Pernambuco perdeu o poder no Estado para Eduardo Campos exatamente por não ter conseguido fazer bom uso do instrumento da máquina. Deixou escapulir por entre os dedos a vantagem, e os socialistas, que começaram a campanha com o apoio de pouco mais de dez prefeitos, terminaram vitoriosos.

Um erro que Eduardo quer evitar. E trabalhando em silêncio, sob a justificativa de promover apenas situações administrativas - ainda que beneficiem prefeitos adversários - ele vai construindo um palanque com alicerces fortes.

A estratégia pode trazer para o governador um ganho extra, porque o adversário que o Palácio não deseja enfrentar em 2010 é o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB), visto como o único que poderia fazer sombra à reeleição do governador. E Jarbas, por sua vez, não tem vontade de voltar a disputar o governo, colocando em risco, inclusive, a boa vitória que obteve sobre os socialistas em 1998.

Com a oposição enfraquecida pelo rolo-compressor do governo e sofrendo mais baixas a cada viagem de Eduardo pelo interior, o senador peemedebista tem a desculpa perfeita - fornecida pelos próprios adversários - para justificar a renúncia à candidatura. Que, afinal, foi cogitada por seus aliados, mas nunca por ele próprio.

quinta-feira, 7 de maio de 2009




















Ele é a cara do Congresso!

Depois da cassação de Severino Cavalcanti, enfim aparece um parlamentar que concentra as características necessárias para simbolizar o atual perfil do nosso Congresso Nacional. Trata-se do semi-obscuro deputado federal Sérgio Moraes, do PTB gaúcho.

Relator do processo aberto contra o deputado Edmar Moreira – aquele dono de um castelo avaliado em R$ 25 milhões – por quebra do decoro parlamentar, Moraes deixou claro que pretende dar parecer a favor do colega. O gaúcho disse publicamente que não via razão para condená-lo, por avaliar que Moreira não cometeu irregularidade ao utilizar R$ 230 mil da verba indenizatória a que os parlamentares têm direito para pagar por “serviços de segurança” prestados a ele por sua própria empresa.

Mas o principal indício de que Sérgio Moraes reflete a imagem atual do Congresso ficou evidente quando ele foi questionado por jornalistas sobre se não estaria preocupado com a má repercussão, junto à opinião pública, ao fazer uma absolvição prévia de Edmar, sem aprofundar as investigações. Em resposta, com a cara mais lavada, Moraes saiu-se com esta: “Estou me lixando para a opinião pública. Até porque parte dela não acredita no que vocês escrevem. Vocês batem, mas a gente se reelege”.

O tom da afirmação, por si, já é descortês. Mas engana-se quem pensa que a grosseria do deputado gaúcho recai diretamente sobre a imprensa. Ao demonstrar tamanha “autoconfiança”, o nobre parlamentar – que fez questão de afirmar ter sete mandatos e uma esposa prefeita – revela total desprezo pelo julgamento dos seus próprios eleitores que, para ele, seriam incapazes de reconhecer uma atitude de improbidade e desatenção para com o bem público.

Em tempo: uma rápida pesquisa na internet revelará um currículo nada brilhante de Moraes que, entre outros pontos, já foi processado por receptação de jóias roubadas e lenocínio e agressão. Como prêmio, foi escolhido para integrar o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados. Não é curioso?

Esse novo episódio é, acima de qualquer coisa, mais uma prova de que grande parte dos congressistas está, mesmo, se lixando para o que a opinião pública pensa das suas iniciativas pouco louváveis, acostumados que estão a garantir sua reeleição por currais eleitorais. Prática que se arrasta no Brasil há séculos, por mais que se combata. Graças, principalmente, aos Moreiras e Moraes do Parlamento, que se acreditam donos dos próprios mandatos. E pior, do dinheiro público.

domingo, 3 de maio de 2009














O sonho dos paladinos

Esta semana, o grupo de deputados da Frente Parlamentar de Combate à Corrupção, formada na Câmara Federal, procura o presidente da Casa, Michel Temer, para propor a criação de uma comissão oficial com a quixotesca missão de fazer “andar” todos os projetos em tramitação que tenham como objetivo moralizar o Poder.

Explico o termo “quixotesco”: o grupo – do qual faz parte o pernambucano Paulo Rubem Santiago (PDT) – é formado por um pequeno punhado de parlamentares que sonham com uma faxina ética no Legislativo. E, por que não, nos demais poderes constituídos do País.

Em meio à onda de escândalos, a iniciativa é louvável. Mas esbarra na cultura política atual, que se baseia – falando num sentido generalista – na famosa lei de Gérson. Aquela que diz que você deve levar vantagem em tudo.

Poucos são os que se dispõem, hoje, a abrir mão e combater as mordomias e as facilidades, garantidas por leis e normas internas, para botar a mão nos recursos públicos. O chamado “dinheiro de ninguém”. Quer seja em passagens aéreas, quer em verbas de gabinete ou indenizatórias, cuja prestação de contas termina, por vezes, num tratado absolutamente fantasioso.

Os “paladinos” querem, ainda, rever a atual fórmula de indicações dos procuradores de Estado e dos conselheiros de contas, hoje escolhidos por indicação política. Ou seja: além de combater o livre uso de verbas públicas pelos colegas, querem coibir o abuso de apadrinhamentos. Uma missão quase impossível.

O grupo adverte que se a comissão proposta não for aprovada, vai fazer o trabalho de maneira informal. Seus integrantes vão reunir, espontaneamente, todos os projetos e ações voltados ao combate à corrupção pública e tentar fazer com que sejam colocados em votação. Mesmo cientes de que a derrota, em vários casos, é iminente, dada à ampla maioria de deputados e senadores que preferem manter o status quo.

Vale, porém, a iniciativa. Na menor das hipóteses, é mais uma forma de chamar a atenção da sociedade para as brechas utilizadas pelos parlamentares para burlar a ética e meter a mão no dinheiro que tem dono, sim. O contribuinte. Que vai às urnas no ano que vem.